A NOSSA PEDAGOGIA

Inspiração na Abordagem de Reggio Emilia

Em 1946, após a Segunda Guerra Mundial, numa aldeia chamada Vila Cella, localizada na província de Reggio Emilia no norte de Itália, os residentes depararam-se com um rasto de destruição e pobreza da guerra que acabara de terminar.

Deparando-se com aquela realidade, mães, trabalhadores e comerciantes surgiram com a ideia de construir uma escola para Crianças. Estas pessoas, que tinham perdido tudo durante a guerra, acabaram por se unir, partilhando todos do objetivo de concretizar a tal ideia.

Perante a escassez de recursos, erguer a escola só foi possível com a venda de material de guerra deixados pelos alemães no pós-guerra, tendo sido um movimento inicial que envolveu toda a comunidade, mas especialmente os pais, tendo nascido do desejo de reconstrução da própria história e da possibilidade de oferecer uma vida melhor aos seus filhos.

Esta escassez de recursos veio ainda a marcar profundamente este modelo, pois com origem nessa falta de recursos, faz-se uso de muitos materiais naturais e muitos materiais de desperdício (restos de tecidos, botões, madeiras, retalhos, tudo o que se possa imaginar). Todas estas “peças soltas” destituídas dos seus propósitos originais, são grandemente utilizadas na expressão das Crianças nas escolas de inspiração Reggio Emilia.

Ainda muito devido a esta história de base, Reggio Emilia é uma filosofia diferente, enraizada na vontade das famílias de construir um mundo melhor através da Educação. É uma abordagem inspiradora, motivante e que nos devolve a esperança de acreditar numa educação para todos, feita por todos, num espaço educativo aberto aos outros e onde as relações são a base para toda a aprendizagem.

Numa escola de inspiração Reggio Emilia tanto os pais como os alunos fazem parte dela. Os eventos são organizados pelas famílias, professores e alunos, tendo como grandes objetivos a integração e a coletividade. Aqui, a escola constitui uma continuidade do lar e promove uma crescente intensificação do seu papel sociocultural na sociedade onde está inserida.

O ensino em Reggio Emilia funciona com base na experiência com todo o tipo de materiais e usando os cinco sentidos. Este facto proporciona o livre curso rumo à criatividade da Criança, sendo um ponto forte a ligação à Natureza. Não existem programas pedagógicos obrigatórios, nem actividades delineadas para cada dia. Cada dia é único e imprevisível.

Nas pré-escolas Reggio Emilia cada criança é vista como infinitamente capaz, criativa, e inteligente. O trabalho do professor é suportar estas qualidades e desafiar os alunos das formas mais apropriadas.” Louise Boyd Cadwell

Um dos princípios base assenta  no facto de as Crianças terem direitos no que respeita à sua aprendizagem. São colocadas no centro da prática ao serem tratadas como “portadoras de conhecimento”. Valorizando-se a Criança desta forma, os educadores têm de colocar mais ênfase no ouvir verdadeiramente as Crianças, reconhecendo-se que estas precisam de amplo tempo e de amplo espaço para se expressarem a si próprias.

As Crianças são assim construtores ativos do conhecimento, sendo encorajados a ser investigadores ao mesmo tempo.

Assim, o trabalho nestas escolas ganha muitas vezes a forma de projetos onde as Crianças têm oportunidade de participar ativamente, questionar, explorar e compreender. Além disso, como referimos acima, sendo o sentido de comunidade fortemente cultivado, é dado um grande destaque ao desenvolvimento social das Crianças como parte da Comunidade e às suas relações com os outros, sejam crianças, famílias ou professores.

“A nossa imagem das crianças não as considera mais como isoladas e egocêntricas, não as vê unicamente como envolvidas na acção com objetos, não enfatiza apenas aspectos cognitivos, não menospreza sentimentos ou o que não seja lógico… Ao contrário, a nossa imagem da criança é rica em potencial, força, poder, competência, e, acima de tudo, conectada com adultos e crianças.” Loris Malaguzzi

Não obstante não termos chegado perto que alcançar esses ideais impossíveis, ainda assim o atelier sempre nos compensou. Tem provado, como desejado, ser subversivo – gerando complexidade e novas formas de pensamento. Sempre alcançou combinações e possibilidades criativas entre as diferentes (simbólicas) linguagens das crianças” (As Cem Linguagens das Crianças).

Queremos que seja a criança a pensar pela sua cabeça e não pela dos outros, que seja capaz de decidir responsavelmente, que seja criativa e não que faça aquilo que os adultos esperam dela. A abordagem Reggio Emilia permite, pois, que a criança, ao seu próprio ritmo, seja a protagonista da construção do seu próprio conhecimento. Envolvêmo-la assim naquilo que ela gosta e aproveitamos a oportunidade para introduzir os conteúdos adequados para que as aprendizagens sejam significativas, façam sentido, mas sem perder de vista os valores humanos e a preocupação com o mundo que a rodeia”, Revista Pais&Filhos, Edição de 18/04/2016


“A criança é feita de cem.

A criança tem cem mãos cem pensamentos

cem modos de pensar de jogar e de falar.

Cem sempre cem modos de escutar as maravilhas de amar.

Cem alegrias para cantar e compreender.

Cem mundos para descobrir.

Cem mundos para inventar.

Cem mundos para sonhar.

A criança tem cem linguagens (e depois cem cem cem) mas roubaram-lhe noventa e nove.

A escola e a cultura lhe separam a cabeça do corpo.

Dizem-lhe: de pensar sem as mãos

de fazer sem a cabeça

de escutar e de não falar

de compreender sem alegrias

de amar e de maravilhar-se só na Páscoa e no Natal.

Dizem-lhe: de descobrir um mundo que já existe

e de cem roubaram-lhe noventa e nove.

Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho

a realidade e a fantasia

a ciência e a imaginação

o céu e a terra

a razão e o sonho

são coisas que não estão juntas.

Dizem-lhe enfim: que as cem não existem.

A criança diz: ao contrário, as cem existem.”

Malaguzzi (1997). As Cem Linguagens da Criança.